Capital
(Guinga e Simone Guimarães)
Devagarinho vão deixando a estação, coisa e tal
Segue Nensinho, Bá e Joca, o varão do casal
Vai ter de tudo novo lá na capital,
Precisam ver as coisas lindas que me contam de lá
É o que há!
Deve ser mesmo muito bom viajar
Pra um lugar
E em todo canto ver a fresta do mar, arejar
Quando chegarem, ai meu Deus!
Como vai ser na capital?
Será que canta o urutau, pica-pau, sabiá...
Será que encontram algum mato pra lenhar, capinar?
Quantos docinhos Bá vai poder fazer?
Será que alguém pode querer comprar?
Tem antes que experimentar.
O varãozinho foi pro vestibular, se casou
Bá e Nensinho fazem o que pintar prum doutor
Lobotomia não é mesmo o forte do nosso casal
Onde houver desfeita partem prum pau
Federal
Arrumam "zica" em fila de hospital, "carnaval"
Esse direito é constitucional
Perante Deus todos somos iguais
E assim ninguém maltrata mais
Tem um relógio do tamanho do sol
É um monumento à Central do Brasil
Quando ela chama as flores tem que acordar, tudo amanhecer, Joca despertar
O Cobrador tem uma kombi infernal
Com um cheirinho doido de camarão
E palmilhando os trilhos da capital
Sinto léguas de sertão
Quem sabe um dia Joca volta pra cá num carrão
E um tsunami traz um pouco de mar pro sertão
Vai ter de tudo pra vender lá na estação
Como vai ter!
De tapioca até de frutos do mar, medalhão
De carne-seca, body de carcará, num tufão
E a profecia do mar virar sertão
Sai dos humildes altares pro céu
E sobra bispo no tropéu
Eu tenho andado com medo de pensar no Nensinho
É tiroteio no meio desse mar de caminho
Nesse papel pode o céu do meu sertão virar só cinzas
Pode cordel desmanchar, que já se sente na pele
E a ciranda cansar mesmo antes que se revele
E a missa só começou, depois tem mais
Melhor rezar, já que quem foi não quer voltar.