Boa noite, quero dizer, boa noite
Para quem passo bem longe desse recinto
Neste fim de semana
O que, infelizmente não foi o meu caso
Aqui, assisti à apresentação póstuma
Da rica tradição dos poemas bufos
Silenciosos e picantes pérolas da Idade Média
Encenados por uma portuguesa
Que demonstrou com este espetáculo
Um grande talento para açougueira
O que sabe este homem
Do chão em brasas do palco?
Acaso nessa fogueira alguma vez já queimou?
Ou ao menos já caminhou
Por esse chão encarnado, rasgando o coração?
Marcado, sofrido, castigado coração
Acaso já foi ninguém pra ser muitos?
Pra ser rei, cristão, leão, alguém, algum
Em lugar nenhum
No chão em brasas do palco?
A atriz que transformou
A nossa noite num naufrágio
Teve os seus três minutos de carreira teatral
Porque no que depender de mim
A sua carreira acabou
Aliás, a sua vida acabou
Nos deixando com a certeza que
O melhor desempenho da noite
É o de suas pernas
O que sabe este homem
Do chão em brasas do palco?
Acaso nessa fogueira alguma vez já pisou?
Ou será que ele ao menos já navegou
Nas aldeias de nossas veias
nas terras imensas de nossas crenças
Nos vícios e defeitos
Afinal, de que são feito os homens?
Enquanto esse homem fala, eu não esqueço
A máscara que aqueço
No chão em brasas do palco
Ó deuses, porque tive de presencias
A mais eta chacina do Teatro
Nestes tristes trópicos?
Os figurinos fizeram chorar de saudades
De tantos outros que vi na Corte
Ai que pontada!
Na verdade, eu mal a ouvi, nem vi, nem nada
Tamanha é a força da interpretação
Da atriz a cargo de destruir esse papel
À essa atriz vai um recado especial: Desista!
O ator é o que vê o mistério sério, cômico
Adivinho vira o homem pelo avesso
Do começo ao fim do seu caminho
Até amanhã, com mais uma edição da Província, Província
Com meu relato real: Era uma vez uma carreira