Aqui me ponho a cantar
Ao compasso da guitarra
Que o índio que se desgarra
Nunca mais pode parar
Viver é contrapontear
Na tristeza onde se atola
Sem jamais pedir esmola
Nem carinho, nem perdão,
Pois abrindo o coração
É que o guasca se consola
E adonde venho respondo:
Sou da pampa e do varzedo
Guri criado sem medo
De cobra ou de marimbondo
Eu sei que o mundo é redondo
No seu arrodear sem fim
Índio pobre, e mesmo assim
Me alimento com meu canto
Tantos são donos de tanto
Ninguém é dono de mim
(Talvez por ser prisioneiro
Das ânsias e rebeldias
De andar as noites e os dias
Rondando como tropeiro
Talvez por ser guitarrero
Criado sem protovolo
Desde que mamei no colo
Da mama bugra campeira
Trago a alma prisioneira
Das coisas que vêm do solo)
Enquanto houver um paisano
Que ponteie uma guitarra
Enquanto houver uma garra
No lombo de um orelhano
Enquanto houver um pampeano
Guardando o sagrado estilo
Eu hei de seguir tranqüilo
Sem galopear, não me apuro
Porque quanto mais escuro
Mais claro é o canto do grilo
E quando eu me for, indiada,
Não quero mágoa nem choro
Não vai fazer falta um touro
Há tantos nesta invernada
Um 'Deus te salve', mais nada
Quando souberem: morreu
Já podem saber que eu
Que esbanjei tantos carinhos
Ando a campear nos caminhos
O que eu quis ser e não deu
Ando a campear nos caminhos
O que eu quis ser e não deu